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Notificação de Sinistro em RC Profissional: Como Evitar a Perda do Direito à Indenização

Um e-mail de um cliente insatisfeito, uma carta com tom de ameaça, um boato de que um projeto apresentou problemas. Para o profissional dedicado, a primeira reação é tentar resolver a situação diretamente, usar sua expertise para contornar a crise e preservar a relação com o cliente. A última coisa que passa pela cabeça é acionar o seguro por algo que ainda nem parece um problema real.

É exatamente nessa hesitação, nesse instinto de “resolver internamente”, que reside um dos maiores riscos para a cobertura do seu seguro de Responsabilidade Civil Profissional (E&O). A notificação do sinistro, ou da expectativa de um sinistro, não é uma formalidade a ser cumprida apenas quando o processo judicial chega; ela é o ato jurídico que ativa a sua apólice e preserva o seu direito à defesa.

No escritório Nunes Advogados, testemunhamos inúmeros casos em que profissionais impecáveis tecnicamente perderam sua cobertura por uma falha no momento e na forma de comunicar o sinistro ou a expectativa à seguradora. Compreender a lógica por trás da notificação não é burocracia, é estratégia de sobrevivência profissional.

Por que a Notificação é Tão Crítica em Apólices “Claims Made”?

A grande maioria das apólices de E&O no Brasil é do tipo “claims made”, isto é, à “base de reclamação”. Diferente de um seguro de automóvel, onde a cobertura vale para o acidente ocorrido durante a vigência (apólices à “base de ocorrência”), em uma apólice claims made, duas condições precisam ser atendidas:

  1. O ato falho deve ter ocorrido após a data de retroatividade da cobertura.
  2. A reclamação do terceiro contra você deve ser feita (e comunicada à seguradora) durante a vigência da apólice ou durante um período adicional, chamado prazo complementar e prazo suplementar.

Isso significa que o tempo é, literalmente, um elemento essencial do seu contrato. Atrasar a notificação não é apenas uma falha administrativa; pode ser o equivalente a deixar a apólice expirar antes de usá-la.

A Pergunta de Milhões: Quando Exatamente o Relógio Começa a Correr?

Este é o cerne da questão e o principal ponto de disputa com as seguradoras. A obrigação de notificar nasce quando você tem conhecimento de uma “Reclamação” ou de uma “Circunstância” que possa gerar um sinistro futuro,  neste último caso também chamado de “expectativa de sinistro”. Mas o que esses termos realmente significam?

O Conceito Amplo de “Reclamação”

Uma “reclamação” não é apenas uma citação judicial. A maioria das apólices define o termo de forma muito mais ampla, podendo incluir:

  • Qualquer demanda escrita, seja por carta, notificação extrajudicial ou e-mail, que impute um erro e exija uma compensação financeira ou não-financeira; e
  • Uma ação judicial, processo administrativo ou arbitragem formalmente instaurada contra o segurado.

Isso significa que aquele e-mail mais ríspido de um cliente, exigindo o refazimento de um serviço ou uma compensação por perdas e danos, pode já ser uma “reclamação” para fins de seguro e precisa ser notificado. Ainda que a apólice não considere eventual demanda administrativa, ou seja extrajudicial, como sendo uma reclamação, é possível que você seja obrigado a comunicar à seguradora tal evento como sendo uma “expectativa de sinistro” 

A Zona Cinzenta da “Circunstância”

A obrigação de notificar uma “circunstância” relevante, também conhecida como “expectativa de sinistro”, é ainda mais complexa. Trata-se de qualquer fato, ato ou erro que, embora ainda não tenha gerado uma reclamação formal, tenha um potencial razoável de gerá-la no futuro.

  • Exemplo Prático: Você é um engenheiro e descobre um erro de cálculo em um projeto já entregue. Ninguém reclamou ainda, mas você sabe que, se o erro for descoberto, isto poderá resultar em prejuízos ao cliente. Esta descoberta, do potencial risco de causar prejuízo a terceiros, já é uma “circunstância” que deve ser notificada à seguradora sob a chancela de “expectativa de sinistro”.

A seguradora poderá negar cobertura a uma reclamação futura caso você deixe de comunicar à seguradora, durante a vigência da apólice em que se descobriu a falha profissional, tal “circunstância” que poderia ensejar um prejuízo futuro a terceiros.

O Princípio da “Ciência Inequívoca” como sua Defesa

Diante de tanta subjetividade, a lei e a jurisprudência protegem o segurado através do princípio da “ciência inequívoca”. O prazo para notificar só começa a correr a partir do momento em que o profissional tem conhecimento claro, objetivo e inquestionável de que existe uma reclamação ou uma circunstância com real potencial de perda. Rumores, insatisfações vagas ou problemas cotidianos da profissão não são suficientes para iniciar esse prazo. Nossa defesa se concentra em provar que, no momento alegado pela seguradora, o que existia era uma mera possibilidade, e não uma ciência inequívoca de um problema real.

Erros Comuns na Notificação que Podem Custar sua Cobertura

  1. Esperar a Citação Judicial: Este é o erro mais fatal. Ao esperar o processo para notificar a seguradora pela primeira vez, você pode ter deixado o prazo da apólice em que a reclamação surgiu (ex: a notificação extrajudicial) expirar, perdendo o direito à cobertura.
  2. Fazer uma Notificação Informal e Incompleta: Uma ligação para o corretor ou um e-mail simples para a seguradora dizendo “tive um problema” não constitui uma notificação formal. A comunicação precisa ser feita por escrito, de forma detalhada, documentada e seguindo os canais indicados na apólice.
  3. Admitir Culpa ou Propor um Acordo: Na ânsia de resolver o problema, muitos profissionais acabam por admitir sua responsabilidade ou oferecer um acordo ao cliente antes de falar com a seguradora. Isso é extremamente perigoso, pois a legislação proíbe que o segurado admita sua responsabilidade ou faça acordos sem o consentimento prévio e por escrito da seguradora.

A Abordagem da Nunes Advogados: Notificação como um Ato Estratégico

Nós vemos a notificação de sinistro não como uma formalidade, mas como o primeiro ato de defesa. Nossa metodologia envolve:

  • Análise Imediata: Avaliamos a comunicação recebida pelo cliente para determinar se ela se enquadra, ou não, como “reclamação” ou “circunstância de expectativa de sinistro” nos termos da apólice.
  • Preservação dos Fatos: Orientamos o cliente sobre a melhor forma de documentar os fatos sem produzir provas contra si e sem violar os termos da apólice.
  • Elaboração Técnica da Notificação: Redigimos a notificação à seguradora de forma estratégica. Apresentamos os fatos de maneira objetiva, enquadrando-os corretamente nos termos do contrato, e já antecipando possíveis argumentos de negativa, sem fazer qualquer admissão de responsabilidade.

Trata-se de exercer um direito contratual com a formalidade e a técnica que a situação exige.

Não deixe que uma falha de procedimento coloque em risco a proteção que você tanto se esforçou para construir. Uma notificação bem-feita é o fundamento de uma defesa bem-sucedida.

Para uma visão mais ampla sobre os desafios em apólices de RC, explore nossa página sobre a Defesa Estratégica em Seguros de Responsabilidade Civil.